Carregamento obrigatório de canais de TV aberta é um golpe no setor de TV paga, diz ABTA

Em nota divulgada nesta sexta-feira, 18 a Associação Brasileira de Televisão por Assinatura (ABTA) diz que uma emenda inserida na Medida Provisória 1018/2020, sancionada na última quarta-feira, 15, pelo presidente Jair Bolsonaro, traz sérios prejuízos para o setor de TV por assinatura. O problema havia sido antecipado por este noticiário quando a emenda foi apresentada.

A entidade diz que o artigo 11 da MP, que modificou parte da Lei 12.485/2011 (Lei do SeAC) (Serviço de Acesso Condicionado), que regula o setor de TV paga, foi um duro golpe no setor de TV por assinatura, que já vem sendo afetado por uma grave crise.

A decisão do presidente em manter este artigo atende apenas aos interesses de um grupo de geradoras e retransmissoras de TV, prejudicando operadoras e assinantes do serviço de TV paga, diz a ABTA.

"Tal medida só interessa a um pequeno grupo de agentes – algumas geradoras de TV e seus retransmissores – que deixam de pagar às operadoras de TV por assinatura pelo carregamento dos seus canais. Trata-se de uma manobra oportunista, em detrimento de todo um setor e sem benefício algum para a sociedade", denuncia a ABTA no comunicado.

Outro agravante do artigo 11 da MP 1018 apontado pela entidade no comunicado divulgado nesta sexta, 18, é a interferência em modelos de negócios e contratos vigentes, nos quais o canal remunerava um carregamento que passa a ser gratuito.  "Ou seja, o artigo 11 da MP 1019 certamente gerará um passivo para a União, que terá que indenizar essa expropriação de receita, das operadoras", prevê a ABTA.

Inconstitucionalidade

A ABTA diz também que além da interferência indevida no setor, o artigo 11 da MP 1018 ainda é inconstitucional, uma vez que o artigo 21, XI, da Constituição Federal, veda o uso de medida provisória para regulamentação da prestação de serviço de telecomunicações.

Obrigar o carregamento gratuito de dezenas de novos canais na TV por assinatura é um retrocesso e um peso a mais para as operadoras, em um momento em que o setor já enfrenta uma grave crise, perdendo 5 milhões de assinantes em seis anos, em razão das sucessivas crises econômicas do país, explica o documento da entidade.



A  entidade esclarece que o carregamento obrigatório de canais é fruto de uma época de limitação de cobertura na difusão de sinais abertos analógicos, e de escassez de redes de distribuição, quando não havia redes concorrentes nem internet e os canais obrigatórios não tinham alternativa de distribuição.

"No início da TV por assinatura, esta era praticamente uma antena eletrônica para a radiodifusão, em especial nas regiões mais afastadas dos grandes centros. Hoje, a radiodifusão digital está universalizada e permite a recepção de sinais de boa qualidade em todo o país", justifica a ABTA, dizendo que o referido artigo é anacrônico.

Com a digitalização da TV aberta, a distribuição destes sinais na TV paga também passou a ser livremente contratada entre emissoras e operadoras. Além disso, todos os canais abertos, ou pelos menos de cabeça de rede, são distribuídos pela internet. O mesmo ocorre com todos os canais de distribuição obrigatória. Ou seja, todos esses canais são carregados pela mesma rede da TV por assinatura, sem qualquer remuneração para as operadoras e o mais grave: ocupando grande capacidade de banda de internet, que poderia estar sendo utilizada por milhões de assinantes.

Por fim, a ABTA diz que o artigo 11 da MP 1018 contraria ainda os esforços do próprio governo de rever o marco legal da TV por assinatura no Brasil. "Esse é o objetivo do Grupo de Trabalho, criado em novembro do ano passado, no Ministério das Comunicações, que deve sugerir ao Congresso Nacional um aprimoramento ao marco legal vigente, em razão das enormes transformações pelas quais passa o setor no Brasil e no mundo. Para tanto, o grupo está coletando subsídios de todos os envolvidos neste mercado".

A entidade espera que o Grupo de Trabalho------------------------------------------------- leve a uma redução de obrigações no setor, corrigindo as assimetrias tributárias e regulatórias em relação às novas formas de entrega de vídeo, que hoje inviabilizam o negócio de TV por Assinatura. Neste contexto, a criação de novas obrigações, pela MP 1018, é um retrocesso, que agrava ainda mais a crise desta indústria e que precisa ser corrigido.

A polêmica

O artigo que foi incluído na Medida Provisória altera a Lei 12.485/2011 (Lei do SeAC) e passa a enquadrar retransmissoras de TV, e não apenas geradoras, entre os radiodifusores que podem exigir o carregamento de seus sinais pelas operadoras do Serviço de Acesso Condicionado (TV por assinatura). A diferença entre geradoras é que estas são concessões de TV e podem produzir programação própria e vender comerciais. Já as retransmissoras, como o próprio nome diz, apenas retransmitem os sinais de geradoras, sem conteúdo próprio (exceto na Amazônia Legal).

Atualmente, a regra da Lei do SeAC prevê que as geradoras analógicas devem ser carregadas nas praças em que operam. No caso de já estarem digitalizadas, elas podem negociar um valor pela distribuição ou, não havendo acordo, podem exigir o carregamento gratuito. Caso haja alguma limitação técnica, cabe à Anatel decidir o que fazer. Para as operadoras que usam o cabo como tecnologia de distribuição essa regra nunca foi problemática porque como a operação é local, basta levar os sinais das geradoras daquela cidade. Mas para as que operam DTH seria impossível, pois são mais de 800 geradoras nacionalmente. Por isso a Anatel estabeleceu uma regra na Resolução 581/2018, que prevê um limitador: só devem ser carregados aquelas geradoras "pertencente a um conjunto de estações, sejam geradoras locais ou retransmissoras, e caracterizado pela presença em todas as regiões geopolíticas do país, pelo alcance de, ao menos, um terço da população brasileira e pelo provimento da maior parte da programação por uma das estações para as demais". Existem 16 geradoras nessas condições, que são chamadas de "redes nacionais" (apesar desse termo não ter uma definição jurídica).

O que a mudança trazida na MP do Fistel faz é alterar a Lei do SeAC para que as "as retransmissoras (…) pertencentes a um conjunto de estações, sejam geradoras locais ou retransmissoras, com presença em todas as regiões geopolíticas do país, e pelo alcance de, ao menos, um terço da população brasileira com o provimento da maior parte da programação por uma das estações" tenham o mesmo tratamento legal das geradoras locais.

Na prática, o efeito é multiplicador da quantidade de emissoras que poderiam pleitear esse direito junto às empresas de TV paga. Empresas de radiodifusão que hoje operam apenas como retransmissoras poderão reclamar um lugar à mesa com as operadoras de cabo e DTH para negociar a sua distribuição e, não havendo acordo, poderão exigir o carregamento gratuito.

As operadoras de TV paga poderão alegar impossibilidade técnica e o assunto será jogado para a Anatel, que provavelmente usará a regra já existente: exigir a distribuição apenas das 16 redes nacionais. Mas as emissoras ganham poder de barganha e, mais importante, ganham carregamento gratuito caso não haja acordo comercial. Hoje, algumas operadoras de TV a cabo cobram para distribuir retransmissoras de TV quando elas não se enquadram nas previsões legais.

Para as operadoras de DTH as implicações devem ser menores porque elas já são obrigadas a pedir uma exceção por conta das limitações técnicas e já seguem a regra das 16 redes nacionais. Mas para as operadoras de cabo o cenário será novo e de negociação complexa.

As 16 "redes nacionais" definidas pela Anatel em regulamentação são: 

  • Band
  • Canção Nova
  • Globo
  • Ideal TV
  • Rádio e TV Aparecida
  • Record
  • Record News
  • Rede Brasil de Televisão
  • Rede Internacional de Televisão
  • Rede CNT
  • Rede RBI
  • Rede TV!
  • Rede Vida
  • SBT
  • TV Cultura
  • TVCI

Post a Comment

Deixe seu comentário

Postagem Anterior Próxima Postagem