Rádio Inconfidência AM 880 BH será extinta


Novo presidente da emissora afirmou que funcionários devem ser demitidos; fechamento da frequência AM deve acontecer em 30 dias

A rádio Inconfidência AM, fundada em 1936 e conhecida como “O Gigante do Ar”, vai encerrar suas atividades. A extinção da rádio – que exibe o programa “A Hora do Fazendeiro”, o mais antigo do Brasil – foi confirmada nesta sexta-feira pelo presidente Ronan Scoralick.

O secretário de Estado de Cultura e Turismo, Marcelo Matte, já havia divulgado a informação na última quinta-feira, mediante protestos. Mas, nesta sexta-feira, Scoralick detalhou as causas do fim da rádio. Alegando motivos que mesclam questões financeiras (“a rádio não se banca”) e tecnológicas (“todas as rádios AM vão acabar por imposição legal”), o presidente disse que a extinção da rádio deve acontecer em até 30 dias. Com cerca de uma centena de funcionários, a emissora também vai passar por um processo de demissão. Além de terceirizados e comissionados, até concursados devem ser exonerados. “Há uma brecha legal para isso, pois o Estado está em situação financeira complicada”, disse o presidente.

O cenário atual contrasta com o de dois anos atrás, quando os 80 anos da emissora foram celebrados com festejos. O provável futuro desolador acabou incentivando a diretora artística Brisa Marques a pedir demissão. “Cultura, cidadania e educação eram os pilares da rádio, agora os novos rumos giram em torno de uma questão financeira, mas acho que é possível equilibrar esses dois objetivos”, disse Brisa. O presidente avalia um profissional de perfil mais comercial para assumir a vaga.

Com extensa atuação na área de programação de TV, especialmente na Rede Globo, Scoralick confirmou que pretende tornar a Inconfidência mais comercial. “Mas não será a qualquer preço. Não vamos tocar axé nem pagode; sertanejo, só raiz; mas temos que atrair anunciantes. Estamos mudando, mas com critérios”, adiantou. Questionado sobre como tornar comercial uma emissora eminentemente pública e educativa, ele respondeu: “Esse é o desafio”.

Segundo Scoralick, o governo atual tem como meta tornar a rádio sustentável até o fim de 2020. Atualmente, a operação da emissora tem custo anual de R$ 3 milhões.

Apreensão

A manhã desta sexta-feira foi angustiante nos corredores da sede da rádio, situada no Barro Preto. Logo cedo, o presidente convocou toda a equipe para anunciar as mudanças e as demissões. Os funcionários foram informados de que, mesmo concursados, podem ser demitidos e disseram que um processo administrativo será aberto em breve com esse objetivo. Um mapeamento está sendo feito para avaliar quantas e quais pessoas serão exoneradas, mas, nos corredores, o comentário é que esse número pode chegar a um terço dos quadros. A reportagem presenciou funcionários atônitos e alguns chorando. “Como acabar com uma rádio com 82 anos de existência?”, comentou um contratado.

Alguns funcionários chegaram a dar sugestões para evitar esse triste fim, mas o presidente apresentou números de audiência e financeiros e disse que a decisão já está tomada.

Há receio em relação à situação de funcionários mais velhos. “Tenho medo que essas pessoas entrem em depressão”, disse uma funcionária. A maioria dos trabalhadores entrou no concurso realizado em 2005, mas há funcionários com 20, 30, e até 50 anos de casa. “Eu imaginava que ia me aposentar numa rádio de qualidade como essa, pois era o emprego que eu sempre procurei”, disse outro funcionário.

Entidades reprovam decisão

O fim da operação da frequência AM da rádio Inconfidência também pegou de surpresa algumas entidades do setor. O vice-presidente da Associação Mineira de Rádio e Televisão (Amirt), Mayrinck Pinto, lamentou a decisão do governo. “É triste, uma atitude drástica. A Inconfidência é uma referência em Minas, uma emissora com história. Durante a campanha do Romeu Zema (governador do partido Novo), isso não foi falado em momento algum”, disse. “A demissão dos funcionários é algo assustador”, completou.

Para o Intervozes, coletivo que atua na defesa da comunicação pública, faltou diálogo no processo. “O governo peca em não debater amplamente essa questão com todos os setores da sociedade e deslegitima a importância da comunicação pública, que tem como prerrogativa a divulgação de informação de interesse público sem seguir o critério de mercado”, avaliou Raquel Baster, representante do coletivo.

Essa guinada comercial é outro fator que deixa a equipe de cabelo em pé. Alguns duvidam da capacidade da rádio de atrair anunciantes, pois a audiência é muito baixa. “E como vender anúncio tocando Tom Jobim”, contestou outro empregado. Para alguns, o fim da Inconfidência AM é o prenúncio do mesmo destino para a FM. “Ia ficar feio para o Paulo Brant, um cara ligado à cultura, fechar a FM agora”, disse uma funcionária. Scoralick, no entanto, garante o funcionamento da FM.

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