Por:Samuel Possebon
Está claro que a aprovação da fusão entre Time Warner e AT&T no Brasil, que enfrenta o obstáculo da Lei do SeAC (Lei 12.485/2011, que impede a propriedade cruzada entre programadoras e operadoras) enfrentará forte oposição do grupo Globo. A AT&T é controladora da Sky no Brasil e o grupo Time Warner tem os canais Turner e HBO, também presentes na TV paga brasileira. Em debate realizado nesta segunda, 30, durante o PAYTV Forum, evento realizado pelas publicações TELETIME e TELA VIVA em São Paulo, Marcelo Bechara, diretor institucional do Grupo Globo, foi taxativo: se existe um ponto em que a Lei do SeAC é clara é o impedimento de que uma empresa de telecomunicações controle uma programadora, e vice-versa. Segundo ele, essa segregação surgiu dentro do acordo entre empresas de telecom e grupos de mídia na elaboração da Lei do SeAC que permitiu o controle por empresas de capital estrangeiro no segmento de TV a cabo, algo até então vedado. Em contrapartida, preservou-se o mercado de conteúdo. Bechara lembrou que o próprio grupo Globo viu-se obrigado a sair do controle da Sky e da Net logo após a aprovação da lei do SeAC. "Se fosse possível esta interpretação de que a lei não se aplica a programadoras estrangeiras não haveria razão para os canais estarem cumprindo as cotas", diz ele.
Michael Hartman, deputy general counsel da DirecTV Latin America (controladora direta da Sky) defendeu a tese de que a legislação faz uma distinção entre produtoras com sede no Brasil e programadoras que têm a maior parte de seus conteúdos vindos de fora. "A lei existe para proteger os produtores brasileiros, e não as que tem sede no Brasil", disse. Mas ele entende que o futuro da fusão dependerá da forma como a lei for interpretado. "Se for interpretado de maneira restritiva, entendo que não estaremos beneficiando o consumidor, porque o mercado irá se concentrar". Segundo ele, a opção para cumprir a lei será ou a AT&T vender a Sky ("e não vejo ninguém de fora do mercado interessado, então teremos concentração"), ou os canais Turner precisarão sair do país ou irem para um modelo over-the-top, vendidos diretamente ao consumidor ("o que é ruim para a indústria").
Esportes
Pela primeira vez, a AT&T falou sobre a situação de outro conflito existente na interpretação da legislação brasileira: a restrição do artigo 6 da Lei do SeAC, que impede a contratação de talentos e eventos brasileiros, inclusive direitos esportivos, por parte de empresas de telecomunicações. Segundo ele, se a fusão for aprovada no Brasil, o grupo AT&T/Time Warner não deve mais contratar diretamente estes talentos e direitos, optando por contratar de produtores brasileiros, o que incentivaria ainda mais o mercado de produção, diz ele. No caso da Turner, existe uma situação especialmente delicada com o canal Esporte Interativo, que tem inclusive direitos já negociados com times brasileiros para o Campeonato Brasileiro de 2019. "Teremos que rever essas situações", disse Hartman sobre a situação específica do Esporte Interativo.
Celeridade sem pressa
Também participando do debate, o conselheiro da Anatel Leonardo Euler reconheceu que é um caso complexo que se apresenta para a agência. Ele disse que a Anatel pretende analisar com celeridade o caso, mas ainda existe a necessidade de conclusão da análise da área técnica e da consultoria jurídica antes de chegar ao conselho. "Temos interpretações distintas sobre um caso concreto. Obviamente não posso emitir juízo antecipado", disse. Para ele, a lei estabeleceu o artigo 5 para assegurar a diversidade do mercado de TV paga, mas ele reconheceu que existe hoje um problema de duopólio ainda não endereçado nem pela Anatel nem pela Ancine, e que existe uma tendência global de consolidação vertical ao mesmo tempo em que avança a concorrência com serviços OTT, cujo impacto no Brasil ainda não foi considerada na análise de mercados relevantes. Ele disse, contudo, que essa análise concorrencial do mercado não está diretamente vinculada à análise regulatória que será feita pela agência no caso da AT&T com a Time Warner. Segundo apurou este noticiário, a Abert, representando empresas de radiodifusão, está buscando na Anatel ser parte do processo que analisa a fusão, mas o pedido ainda não foi decidido pela agência.
Para Michael Hartman, o ambiente de impasse criado pode beneficiar, indiretamente, os players de Internet. Bechara, contudo, entende que não e que as programadoras e operadoras no Brasil podem seguir com parcerias fortes em contraposição ao avanço dos players OTT.
Marina Cigarini, sócia e head de telecom, mídia e tecnologias da McKinsey no Brasil lembrou que hoje o mercado de pay TV ainda é onde está o dinheiro, mas existe um processo inexorável de avanços dos serviços OTT que estão obrigando a indústria a mudar de rumo e buscar novos modelos, e entre os modelos que estão sendo desenvolvidos está justamente o de consolidar empresas com fortes ativos em conteúdo e empresas de distribuição. Ela lembra que esse cenário enfrenta dificuldades no Brasil diante das limitações legais.
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