Data da postagem:29/05/2017
Por:Samuel Posseibon
A análise do ato de concentração envolvendo a compra do grupo Time Warner pela AT&T pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica será relevante por ser o primeiro teste da implicação concorrencial do artigo 5 da Lei do SeAC (Lei 12.485/2011), dispositivo que estabelece restrições a que empresas de telecomunicações controlem empresas de conteúdos e vice-versa. A pergunta que se coloca é: a Lei do SeAC tinha uma preocupação concorrencial ou visava apenas proteger as empresas de conteúdo do apetite das teles?
Esta semana, o ex-presidente do Cade, Vinícius Marques de Carvalho, publicou um artigo no jornal Valor Econômico se manifestando sobre o caso AT&T/Time Warner. A AT&T é controladora da Sky no Brasil, e a Time Warner é controladora dos canais HBO e dos canais da Turner, entre eles CNN, Cartoon Networks e Esporte Interativo, presentes na TV paga brasileira. O entendimento do advogado, a Lei do SeAC deve ser usada na análise concorrencial porque o objetivo do artigo 5 é, justamente, "evitar condutas discriminatórias e excludentes típicas das estruturas verticalizadas". Ele cita como exemplo o possível "aumento de preço praticado para distribuidores de TV por assinatura concorrentes na venda de conteúdo". De maneira geral, o entendimento da Ancine manifestado ao Cade vai mais ou menos nessa linha.
Gesner Oliveira, outro ex-presidente do Cade e que hoje assessora a AT&T no processo no Brasil, tem posição diferente. Para ele, a legislação setorial, ao criar a limitação à verticalização, tinha como objetivo gerar mais competição no mercado, mas em um contexto em que a competição pela Internet ainda era insipiente. Vale lembrar que a Lei do SeAC foi aprovada mais ou menos na mesma época em que o Netflix estava lançando seus serviços no Brasil.
Nesse aspecto, é preciso levar em consideração uma conta simples: considerando-se o mercado de TV paga apenas nas tecnologias tradicionais, a Sky teria cerca de 28% de market-share. Se for incluída nessa conta uma base de 8 milhões de assinantes do Netflix (número estimado pelo mercado, já que ninguém conhece a base verdadeira), o market-share da Sky cai abaixo de 20%, o que o percentual tipicamente considerado como relevante nesse tipo de análise concorrencial. Além disso, uma empresa como a Netflix tem a sua própria plataforma de distribuição e é também produtora de conteúdo, mas não está sujeita às restrições da Lei do SeAC.
Para Oliveira, há ainda outros problemas. Ele entende que a Instrução Normativa 91/2010 da Ancine extrapola a Lei do SeAC ao estabelecer limites à atuação de programadoras estrangeiras no Brasil. Segundo ele, o Cade, se entendesse razoável, poderia inclusive fazer advocacia da concorrência e requerer que a Ancine alterasse esse aspecto da sua regulamentação por ter um efeito ruim para a concorrência. "Em geral o Cade não adota esse tipo de prática, prefere atuar no campo da recomendação, mas por lei ele poderia requerer isso para órgãos da administração federal".
Outro problema do caso, segundo Gesner Oliveira, é que existe uma sobreposição de competências entre Ancine, Cade e Anatel e as contradições e conflitos gerados por esta sobreposição geram incerteza. "O fato de vermos a superintendência de competição da Anatel com um entendimento diferente da Ancine é ruim. Não é incomum, mas gera incerteza". Nesse aspecto ele também diverge de Vinícius de Carvalho, que eu seu artigo escreve que "cumpre às agências competentes e ao Cade trabalhar em conjunto para a aplicação dos dispositivos legais que visam proteger, em última instância, o consumidor brasileiro". Segundo ele, isso não está acontecendo.
Ao contrário da Ancine, a Anatel ainda não se manifestou sobre este caso junto ao Cade e possivelmente deve fazê-lo na próxima semana. Mas existem alguns precedentes históricos a serem analisados.
Em 2005, quando a Sky adquiriu a DirecTV no Brasil, a agência se manifestou em um ambiente parecido, pois a Sky era controlada por uma grande programadora, a News Corp, dona dos canais Fox. Na ocasião, a recomendação da Anatel, seguida pelo Cade, é que não houvesse nenhum tipo de prática discriminatória na oferta de conteúdos. Ou seja, eles não poderiam ser exclusivos nem oferecidos de maneira diferenciada à Sky/DirecTV. Mas isso aconteceu antes de surgir, na Lei do SeAC, uma limitação legal à restrição de propriedade cruzada, o que só veio a acontecer em 2011.
Fonte:http://convergecom.com.br/teletime/26/05/2017/especialistas-divergem-sobre-aplicacao-da-lei-do-seac-em-analise-concorrencial/?noticiario=TT
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